25.10.13

Sob o signo de Escorpião

Plutão rege Escorpião.

Com uma órbita que dura 250 anos, Plutão tem ainda outro ciclo importante, que marca períodos históricos: o de sua conjunção com Netuno - este dura 450 anos. 

Hades-Plutão e Perséfone

Chamado de Hades pelos gregos, é o senhor do mundo inferior, subterrâneo, e nunca aparece sobre a terra. Simboliza a natureza instintiva, a força da natureza, tudo que está sob a terra: cadáveres, ouro, sementes...

Intensos e poderosos são todos os deuses associados a Escorpião e Plutão: Dionisos, Shiva, Kali, Shakti, a serpente kundalini. 

O mito mais conhecido sobre Hades é o do rapto de Perséfone, a virgem (Coré). Quando ela colhia flores com suas amigas ninfas a terra se abriu e dela saiu Hades, de elmo e manto negros, num carro puxado por cavalos negros. Ele a levou para dentro da fenda que se abrira na terra para sua saída do mundo inferior. O único vestígio que ficou foram pegadas de porcos que estavam no local.
 
Deméter, a deusa da agricultura (Ceres para os romanos), mãe de Perséfone, passa a procurá-la, mas não encontra. Acaba recebendo ajuda de Hécate, a deusa das encruzilhadas, que a acompanha até Febo, o deus do sol que vê tudo. Ao saber o que aconteceu, Deméter determina que nenhuma planta mais vai crescer, e se retira para outra região. Na forma de uma velha, passa a cuidar do bebê, filho do rei, em Elêusis.

Depois de um longo tempo em que os seres vivos estão morrendo de fome, Zeus envia seu mensageiro Hermes a Hades, mas este convence Perséfone a comer sementes de romã, e uma lei do mundo inferior é que quem come algo lá não pode mais sair. Desta forma Perséfone - que simboliza o grão, a semente - vive parte do ano com sua mãe e parte com Hades, que se torna seu marido, fazendo dela a rainha do mundo inferior.
 
Este e outros mitos de descida e subida - que eram usados em iniciações na Antigüidade, como os mistérios de Elêusis - estão ligados ao arquétipo de Plutão: o da morte e renascimento de Dionisos, a descida de Inana, o de Ísis e Osíris, o da Medusa, a serpente emplumada Quetzalcoatl.
 
A passagem do planeta Plutão por um ponto do mapa astrológico pessoal traz sempre transformações profundas e definitivas, exige que olhemos para o sombrio, o que está escondido.

O rapto de Perséfone aparece nos Hinos homéricos, cerca de 700 a.C. Os invasores guerreiros, vindos do noroeste, submeteram as deusas locais a seus deuses armados e recontaram os mitos.

Fontes:
Joseph Campbell,
As máscaras de Deus, Mitologia ocidental

19.10.13

Yoga

Valéria em Paschimottanasana

A prática da Hatha Yoga

 

Inicialmente eu pratiquei hatha yoga querendo atingir alguma coisa. Assim, ansiava que as posturas saíssem, queria alcançar o melhor de mim mesma.
Tive um problema muscular, com muita dor, mas pensava: isso é normal, faz parte do processo. Vendo que esse problema não cessava, procurei um massagista e foi então que meu corpo percebeu algo. Um toque mais duro, incisivo - mais yang, como diriam os chineses - provocava uma reação mais imediata, física, enquanto o toque mais leve, mais sutil, produzia profundas reações emocionais. Era como se eles me embalassem, protegessem, dizendo: "você está em segurança; sinta, seja!"
 
Comecei a ler, pesquisar e experimentar no meu corpo e na minha mente um trabalho onde esta característica mais sutil preponderasse. Vi a relação entre o pensamento chinês e o indiano no professor Hiroshi Motoyama e a partir daí me senti à vontade para pesquisar no Zen Shiatsu. Encontrei o conceito fantástico de que onde nos falta energia (regiões mais flácidas, alongamentos que alcançamos com mais facilidade) está a raiz, a essência de nossos problemas. O problema é "o que nos falta", aquilo que não temos consciência. 
 
Normalmente nossa consciência volta-se para regiões tensas, doloridas, onde há excesso de energia, os alongamentos são mais difíceis - aquelas posturas que não conseguimos fazer (dentro da hatha yoga). Nossa tendência é nos concentrarmos mais ainda nessas partes, lutarmos com elas, ou melhor: contra a tensão, a resistência que nelas encontramos. 
 
Nossa energia acompanha o nosso olhar, a nossa atenção. Nesta prática, portanto, energizamos cada vez mais aquilo que já está repleto. Provavelmente vamos nos tornando cada vez mais unilaterais. Toda consciência numa parte e o resto deixado na sombra da consciência. Este é o caminho preponderante no nosso tempo: o jeito masculino de "enfrentar a vida". Deve haver um outro modo de "viver a vida" e de praticar hatha yoga
 
Por que não trazermos as virtudes femininas da paciência e receptividade para nosso trabalho? Esta me parece a proposta do Zen Shiatsu e é o que venho tentando fazer. Faço as asanas observando meu corpo e respirando. Tento deixar a mente atenta no que está ocorrendo, ouvindo meu corpo. Não brigo com a dor, nem com qualquer outra resistência que meu corpo apresente. Tento simplesmente observar, não querendo alcançar nenhuma meta, nenhum resultado. Tento apenas estar presente aqui e agora. Fico mais tempo nas posturas que me dão mais prazer, as mais fáceis para mim, me permitindo sentir. 
 
E me vêm tantas sensações! (nem sempre agradáveis, diga-se de passagem).

Não tem sido um caminho fácil; sempre me percebo com a tentação de me deixar  levar pelo orgulho e perseguir um objetivo exterior (fazer "melhor", cronometrar o tempo que agüento ficar em cada postura, para bater depois meu próprio recorde, etc...).
É um caminho solitário, imensurável, interminável. Relendo anotações de um livro de Thérèse Bertherat encontrei a seguinte frase: "Na vida estou cada vez menos fazendo de conta". É isso aí!

Nota: a prática de yoga e meditação é reconhecida pela medicina ocidental como benéfica à saúde. A mudança de hábitos, alimentares e outros, vem naturalmente com a prática.

namastê
Valéria


6.10.13

A caixa de Pandora


Encontrei várias versões desse mito na rede, cada uma diferente, a maioria sem semelhança com as fontes clássicas que li. Por isso resolvi contar outra versão.

Pandora aparece pela primeira vez, na literatura, em Hesíodo: na Teogonia não tem nome, em Os trabalhos e os dias é nomeada, mas nos dois é a mesma figura negativa.

Prometeu enganara os deuses pela segunda vez, roubando o fogo e dando-o aos homens. Por vingança Zeus mandou Hefesto fazer do barro uma moça, que Atena adornou com todos os dons e Afrodite com a beleza, e que era “pura malícia”, dom recebido de Hermes. Ela foi a primeira mulher, da qual vieram todas, “que vivem entre os homens para lhes trazer problemas”... pois “têm a natureza de fazer o mal”.

Hermes a leva como presente a Epimeteu, irmão de Prometeu, que a recebe. (Alguns autores dizem que é Prometeu quem se casa com ela.) Pandora, “a que é dotada de tudo”, ou talvez "a doadora de tudo", em casa de Epimeteu, abre o grande jarro de estocar mantimentos – não caixa, isso foi um erro de tradução de Erasmo de Roterdã – onde Zeus prendera todos os males do mundo. Assim se soltam no mundo as doenças, morte, trabalho, sofrimento, todas as pragas e males, enfim, exceto a esperança (ou seria expectativa?), que fica presa no jarro.

Vaso do séc. V a.C.
Ashmolean Museum, Oxford
Antes das fontes escritas, existiu outra versão do mito de Pandora, que aparece nas pinturas em vaso.

Jane Ellen Harrison há um século e Dora e Erwin Panofsky mais recentemente falam da inversão do mito: uma deusa da terra, “ a que tudo doa”, com um grande vaso onde estão todas as coisas boas, que era aberto num ritual. A imagem de vaso do período clássico mostra o anodos, a subida da terra, que é comum a deusas Mãe-Terra, como Gaia.

Pandora, por Fê Beretta

A inversão do mito ocorre para justificar uma nova ordem, na qual um povo guerreiro, portanto patriarcal, com deuses masculinos, submete um povo agricultor, onde a mulher participa da natureza da deusa, como conhecedora dos alimentos, das plantas que curam, dos saberes, enfim, da Deusa-Terra. O novo mito demoniza a deusa do povo vencido, apresentando-a como a causa do mal. 

Ligada ao mito de Prometeu, que por sua vez está relacionado ao signo de Aquário, Pandora participa da natureza desse titã xamânico, também uma criatura da terra. Devo a minha amiga Zila a percepção de que a imagem da constelação de Aquarius é um homem despejando água de um grande vaso.

Aquarius, seg. Hevelius












Para saber mais: 
Lost goddesses of early Greece, Charlene Spretnak