Começo citando um texto extraído do livro “HARA”, de
Karlfried Graf Durckheim:
“O
corpo é a manifestação da alma, e a alma é o sentido do corpo; portanto, não
existe nenhuma estrutura mental e nenhuma tensão espiritual que não se reflita
no corpo. O ponto de gravidade espiritual corresponde ao ponto de gravidade do
corpo, e significa também que o encontro do centro interior é ao mesmo tempo o
encontro do centro físico.
Mas onde fica o centro do corpo? Na
região do umbigo, mais exatamente um pouco abaixo.
Quem possui Hara pode e está preparado
para tudo e também para a morte, resignando-se a qualquer situação. Ele também
pode curvar-se diante do vencedor, sem se entregar e pode esperar. Ele não se opõe contra o fluxo da roda do destino, mas
espera serenamente o tempo passar. Visto pelo prisma do Hara, o mundo é
totalmente diferente. Ele é como é, sempre diferente do que se deseja, mas
continuamente em harmonia com tudo. A obstinação causa sofrimento”.
O Hara, a que se refere o autor é o
centro da energia do nosso corpo, que na
yoga chamamos de manipura (cidade
da jóia), no taoísmo chamamos de tai
chi. Toda prática oriental visa o retorno a esse centro, a permanência
nele, pois quando a energia está concentrada nesse ponto ela pode fluir
livremente pelos canais de energia.
O
remédio é a energia – dizia Mestre Liu Pai Lin. Quando ela flui temos uma condição de saúde, e quando
ela fica estagnada, represada, adoecemos.
Isto
nos remete aos meridianos de energia, que na yoga são chamados de nadhis. Toda
medicina tradicional chinesa se baseia nos meridianos; a acupuntura visa
desobstruir os mesmos, assim como as massagens nascidas no oriente: tui-ná,
shiatzu, do-in, etc...
Os
meridianos fazem a ligação do exterior com o interior, do superficial com o
profundo; atuando sobre o meridiano, atuamos no órgão. Eles são um fluxo de
energia contínuo, como o curso de um rio ininterrupto.
Ao
realizarmos posturas que atuam sobre as laterais do corpo, como os Trikonasanas,
por exemplo, estamos desbloqueando os meridianos de Fígado e Vesícula Biliar (F-VB que) passam por esta região. Cada
meridiano está ligado a um elemento da natureza, a um sabor, a uma estação do
ano, a um clima, a uma atitude, a uma emoção, etc...
Fígado
e Vesícula Biliar estão ligados ao elemento
Madeira; sua energia é de expansão, ela procura abrir caminho, criar
espaços.
Estação: primavera (quando estes meridianos estão ao mesmo
tempo mais ativos e mais sensíveis, precisando de mais atenção e cuidados).
Sabor: ácido (em excesso pode prejudicar a energia do fígado,
mas na dose certa atua como um verdadeiro remédio)
Partes do corpo governadas: nervos e tendões, olhos.
Emoções: raiva, irritação, impaciência.
Atitude: planejamento e decisão.
Nas
posturas que atuam sobre a abertura do tórax, como Ustrasana (a postura do
camelo) estamos desbloqueando os meridianos de Coração e Intestino Delgado (C-ID) que possuem pontos importantes
nesta região e nos braços.
Coração
e Intestino Delgado estão ligados ao elemento
fogo; o sol aquece e permite a vida na terra e o sol em nós é o coração,
que irradia calor humano e alegria. Quando estes meridianos estão
desequilibrados tanto podemos ficar fechados demais, mal humorados ou
histéricos, super excitados.
Estação: Verão
Sabor:
amargo
Partes do corpo governadas: veias e artérias, língua.
Emoções: histeria, hiperexcitação
Atitude: alegria, comunicação, calor humano.
Nas
posturas que atuam sobre a parte anterior das pernas, como os Virasanas,
estamos desbloqueando os meridianos de Estomago e Baço-Pâncras (E-BP), que possuem pontos importantes
nesta região.
Estes
meridianos estão ligados ao elemento Terra
– que é o chão que pisamos, o que nos dá estabilidade, base, centro.
Estação: o final do Verão, mas também a parte final de cada
estação, quando a natureza já prepara o período, a estação seguinte.
Sabor: doce (o doce natural dos alimentos – das frutas, por
exemplo; o açúcar, especialmente o refinado pode causar desequilíbrios nestes
meridianos, especialmente quando ingeridos em excesso)
Partes do corpo governadas: músculos, circulação linfática, boca.
Emoções: preocupação, crítica, pensamento obsessivo.
Atitude: reflexão, permanecer no seu próprio centro.
Nas
posturas que atuam sobre ombros, braços e naquelas que visam desbloquear as
juntas do corpo (aonde a energia se bloqueia mais facilmente) estamos
desbloqueando os meridianos de Pulmão e Intestino Grosso (P-IG).
Estes
meridianos estão ligados ao elemento
Metal, ao período de colheita, quando os frutos estão maduros. Os pulmões
guardam o material precioso, o tesouro sem o qual os demais órgãos não poderiam
funcionar.
Estação: Outono
Sabor: picante (um pouco ajuda a energia, em excesso pode
prejudicar pulmão e intestino grosso)
Partes do corpo governadas: pele e nariz.
Emoções: tristeza, ressentimento.
Atitude: saber criar pausas para absorver as experiências.
Nas
posturas que atuam na parte posterior do corpo, como o Paschimottanasana,
estamos desbloqueando os meridianos de Rins e Bexiga (R-B).
Estes
meridianos estão ligados ao elemento água;
estes meridianos guardam a energia pré-natal, por isso é muito importante
cuidar desses meridianos.
Estação: inverno
Sabor: salgado
Partes do corpo governadas: ossos, medula, ouvidos.
Emoções: medo
Atitude: sabedoria de saber fluir com a vida, buscando
contornar os obstáculos, como faz a água, perseverando pacientemente, esperando
que a semente esteja pronta para germinar.
Estes
meridianos estão em constante fluxo, interagindo constantemente em ciclos de
energia. Cada elemento, cada meridiano, gera outro, em um ciclo de geração de energia:
A
madeira queima, produzindo o Fogo, de cujas cinzas se forma a Terra, e dentro
dela se condensa o Metal que expulsa de si a água. Em outras palavras: madeira
gera fogo, que gera terra, que gera metal, que gera água, que alimenta madeira.
Daí temos o ciclo Mãe-Filho (ou ciclo de
geração):
Madeira(F-VB) é mãe de Fogo;
Fogo(C-ID) é mãe da Terra;
Terra(E-BP) é mãe de Metal;
Metal(P-IG) é mãe da Água;
Água(R-B) é mãe da Madeira.
Se
um meridiano se desequilibra, todo o organismo sofre, pois todos estão
interligados; por este motivo também não adianta tratar um único meridiano (ou
um único órgão).
Mas
temos ainda um outro ciclo de energia: Avó-Neta
ou ciclo de dominação:
A
água apaga o fogo, que funde o metal, que corta a madeira, que esgota a terra,
que absorve a água.
Madeira(F-VB) é avó da Terra;
Fogo(C-ID) é avó do Metal;
Terra(E-BP) é avó da Água;
Metal(P-IG) é avó da Madeira;
Água(R-B) é avó do Fogo.
Este
ciclo auxilia a “manter as coisas no lugar”, equilibrando a energia dos
elementos, dos meridianos e tudo que se refere a eles – como as emoções, por
exemplo.
Por
exemplo: se a energia da madeira (F-VB) está bloqueada (há um excesso) podemos
ajudar a desbloquear recorrendo a avó de Fígado (P-IG). Podemos pensar em
utilizar os sabores - diminuir o ácido que em excesso pode prejudicar esses
meridianos e aumentar com moderação o sabor picante que fortalecendo a avó
ajudará a neta. Podemos ainda utilizar a atitude de P-IG – a introspecção, a meditação,
para ajudar a harmonizar a energia da neta, etc...
Temos
instrumentos para trabalhar nossa energia o que se reflete não apenas na nossa
saúde, na nossa paz interior, mas também nas nossas relações, nos nossos
afetos. Esta paz pode se irradiar do nosso centro – e isso não é algo que
atingimos pela vontade do ego, pelo desejo de sermos bons, de sermos
melhores,etc...vem de encontrarmos nosso centro verdadeiro, o Hara, a “Cidade
da Jóia” que reside em cada ser, e não pertence a ninguém.
Namastê