30.6.11

Aquiles, o herói canceriano

O herói principal da Ilíada de Homero teve um nascimento maravilhoso.

Sua mãe, Tétis, neta de Oceano, sendo a mais bela entre suas cinquenta irmãs, foi cobiçada por Zeus, rei do Olimpo. Mas Têmis, a titânide da lei divina, avisou-o que o filho nascido da bela oceânide seria mais poderoso que o pai.

Zeus - e seu irmão Posídon, que também a desejava - desistiram da corte, e foi determinado pelo patriarca que ela se casaria com um mortal.
Hera ajudou sua protegida a se casar com o mais piedoso e belo dos mortais, Peleu, que no entanto tinha uma história infeliz: educado pelo bondoso Quíron, mais de uma vez fora injustamente perseguido.

Nas noites de Lua cheia Tétis sai à praia para dançar com suas irmãs. Peleu a espera escondido, abraça-a numa luta de amor, e não se assusta quando ela se transforma em fogo, em água, em animal com dentes de leão, em cobra... e por fim se torna um peixe delicado e cede.

Depois da noite de núpcias numa cabana no campo, como era costume, acontece a festa com a presença de todos os deuses. Posídon deu a Peleu dois cavalos imortais, Quíron lhe deu uma lança de freixo... Mas Éris, a deusa da discórdia, não foi convidada. Barrada na porta, atira uma maçã de ouro "à mais bela", e as três deusas mais poderosas se arrogam o direito de pegá-la: Hera, Afrodite e Atena (o conceito de beleza aqui não é apenas físico, mas "a mais alta de todas as coisas boas do mundo").

Nenhum dos presentes ousaria ser juiz nessa disputa, e Zeus escolhe um jovem pastor do sopé dos montes Ida para decidir.

Páris não é um pastor comum. Irmão mais novo de Heitor ("o sustentador"), sua mãe Hécuba, grávida, sonha que dá à luz um tição que incendeia a cidade onde reina seu marido Príamo: Tróia. Cassandra, filha do rei e que recebeu de Apolo o dom da profecia, manda que o bebê seja morto. Exposto no monte Ida, reino da Senhora das Coisas Selvagens, uma ursa o alimenta, e um pastor o recolhe.
Hermes chega com as três deusas à presença do jovem, que se arrepia e tenta fugir.
Entre a vitória e o heroísmo, o império sobre Ásia e África, e a posse de Helena - famosa como a mais bela mulher do mundo - Páris escolhe a última e, como um adolescente incauto, ofende as outras duas deusas.

Peleu e Tétis vão governar a Ftia.

Príamo tem cinquenta filhos, e muitas filhas. Tróia tem a maior casa real de seu tempo. Hécuba, a rainha, é a Hécate frígia: derrotada, se transformará em cadela e se jogará ao mar como Cila. 

Tétis tem um filho, que recebe um nome de rio: Aquiles. Para torná-lo imortal, mergulha-o no Estige, segurando-o pelos pés. Peleu a surpreende e se desgosta: Tétis passa parte do tempo no mar com seu pai Nereu, e Peleu envia Aquiles a seu mestre Quíron para ser educado. Em sua caverna, Quíron o alimenta com entranhas de leões e javalis e tutano de urso, ensina-lhe a arte de curar, as maneiras gentis, e a tocar um instrumento de cordas.

No casamento de Tétis as Moiras ligam o destino de Aquiles a Tróia, por isso, aos 9 anos, a mãe o esconde no harém de um rei, como menina (Pirra, "cabeça vermelha"). As Moiras lhe dão "vida longa e comum ou curta e gloriosa".

Páris chega a Esparta quando Menelau, marido de Helena, está viajando. Afrodite faz com que a imortal rainha se apaixone pelo jovem, e ambos partem para Tróia levando tesouros da cidade. 
A aliança arquitetada por Ulisses entre os antigos pretendentes de Helena obriga todos a se unirem a Agamenon, rei de Micenas e irmão de Menelau, no exército que atacará Tróia, mas só depois de dez anos começa a viagem.

Ulisses decide levar Aquiles para a guerra, e arquiteta um plano para descobri-lo entre as mulheres, uma das quais, Deidêmia, estava grávida de seu filho, Pirro.
Peleu dá ao filho seus cavalos, que Atena torna falantes, e sua lança. Tétis encomenda a Hefesto uma armadura inexpugnável para seu filho.

O mais belo herói da guerra de Tróia desembarca matando na praia um ser primevo, o que põe em fuga os troianos. Tróia é cercada. Apenas mulheres saem para buscar água num poço, acompanhadas por um menino a cavalo, Troilo, filho de Hécuba, até o dia em que Aquiles arranca o menino de cima do cavalo e o decapita no altar de Apolo.

Apolo, Afrodite, Ares e outros deuses estão do lado de Tróia, contra Hera, Atena e outros deuses, que protegem os gregos. 
Apolo protege os adolescentes do sexo masculino, esta morte o ofende.

Por nove anos, como previsto pelos sacerdotes, os gregos matam e pilham nas cidades em redor de Tróia. A bela rainha Briseida é tomada como concubina por Aquiles depois que este lhe mata o marido e os irmãos. Criseida, filha do sacerdote de Apolo, fica para Agamenon, depois que Aquiles mata o rei e seus sete filhos - pai e irmãos de Andrômaca, esposa de Heitor.
O pai de Criseida procura Agamenon com vultoso resgate pela filha, mas Agamenon nunca cede uma mulher, e maltrata o sacerdote. Apolo incita Aquiles a censurar o rei, e a discussão entre ambos desperta a ira de Aquiles e o leva a se recolher em sua tenda.

Apolo envia uma peste que mata os animais e depois os soldados gregos, por isso Agamenon devolve Criseida, mas toma em seu lugar Briseida, por quem Aquiles se apaixonara e era correspondido. 
Aquiles se recusa a participar da guerra com seus homens, e os gregos passam a ser derrotados.
Pátroclo, amigo inseparável de Aquiles, consegue sua armadura emprestada com a recomendação de não atacar Tróia. Entusiasmado por estar invulnerável ele escala os muros e acaba morto por Heitor. 
A dor pela perda leva Aquiles a atacar, apesar do aviso de Tétis: "quando Heitor cair, tua morte estará próxima".


Heitor, marido e pai amoroso de seu filho bebê, sabe que vai morrer e que Tróia acabará, quando se despede da esposa Andrômaca. É o mais nobre caráter retratado por Homero.  

Aquiles mata Heitor e arrasta seu corpo com seus cavalos, não permitindo que seja enterrado. Na pira funerária de Pátroclo mata 12 jovens troianos. Com a ajuda de Hermes o velho rei Príamo atravessa o campo grego e consegue de Aquiles o corpo do filho para lhe prestar as honras fúnebres.

Aquiles e Pentesiléia, c. 540 a.C.
Pentesiléia é morta por Aquiles ao liderar as amazonas, aliadas de Tróia. Só ao matá-la ele percebe sua beleza.
Perto do altar de Apolo é morto por uma seta de Páris - como previra Heitor moribundo -, cuja mão foi guiada pelo deus até o calcanhar do herói.

Ájax e Ulisses demoram um dia para conseguir levar o corpo através do troianos. Seus ossos foram unidos aos de Pátroclo, como era desejo de ambos.
Ou Tétis arrancou o cadáver da pira funerário e levou Aquiles para a Ilha dos Bem-aventurados, dos imortais, onde se uniu a Medéia, ou talvez Ifigênia, ou a mesma Helena. 

Aquiles teria preferido a ação a esse tipo de imortalidade, e só se alegrou ao saber que seu filho ocupou seu lugar na guerra.

Fontes: Karl Kérènyi, Os heróis gregos; Homero, Ilíada

11.6.11

O espírito do tempo presente

Estamos perto do solstício de inverno. No último equinócio conversamos aqui no Espaço Coaraci sobre a moldura arquetípica do período de mudanças que estamos vivendo, em toda a Terra. Este espírito do tempo - Zeitgeist - faz parte de um continuum, é claro, e foi em torno de momentos marcantes dessa sucessão que versou nossa conversa.

O mapa deste equinócio, março de 2011, mostra a configuração desafiadora entre Júpiter, Saturno, Urano e Plutão, que tem estado no céu, de uma forma ou outra, desde o começo do milênio.

Zeus e Hera (Júpiter e Juno)
A moldura social, feita pelos planetas Júpiter e Saturno, é o ciclo iniciado em maio de 2000. Esse ciclo dura 20 anos. Júpiter representa a expansão, e Saturno os limites: dentro destes parâmetros se processa a vida das sociedades humanas. Além do ataque às torres do WTC em NY, e a invasão do Afeganistão, houve o começo da demolição sem aviso prévio de casas palestinas por Israel e o seqüestro do ônibus 174 no Rio, onde a marca de Plutão e Urano afetam os dois planetas sociais, dando o tom do ciclo. A maré vermelha na China, o degelo da Groenlândia, são outra forma de expressão destes mesmos arquétipos dos planetas modernos (visíveis apenas com ajuda de aparelhos). Por outro lado, começa a preocupação com a preservação dos Everglades nos EUA, e do Mar Egeu entre Grécia e Turquia. A 3M deixa de produzir Scotchguard devido aos danos que causa ao ambiente. No Brasil, 200 autoridades são relatadas como envolvidas no tráfico de drogas.

Em 1961, num início de ciclo Júpiter-Saturno, Jânio Quadros tomou posse como presidente do Brasil.

Outro ciclo que se inicia é o de Júpiter e Urano, que dura cerca de 14 anos. Ao mesmo tempo existe uma quadratura entre Júpiter e Plutão (este ciclo também dura cerca de 14 anos, a teve início em 2007). Urano simboliza a mudança, a libertação, e Plutão representa a destruição e regeneração.

Estes três planetas - Júpiter, Urano e Plutão - estavam em conjunção em 1968 (e alguns anos antes e depois), ano muito importante para a história posterior, pelas rebeliões sociais e políticas - pelos direitos civis para os negros nos EUA, pela igualdade das mulheres, contra a guerra do Vietnã, contra as armas nucleares, a greve geral na França, a "primavera de Praga", as revoltas estudantis no Brasil.

Por outro lado, Saturno estava oposto à conjunção dos três planetas, e houve os assassinatos de Martin Luther King e de Robert Kennedy, o massacre de My Lai, a repressão da URSS na Tchecoslováquia, o AI-5 no Brasil. Saturno e Plutão, nestes casos, indicam crise e contração, como no início das duas guerras mundiais do século XX, na ascensão do nazismo e na crise das bolsas de 1929, quando estavam em aspecto tenso.

Em 1968 tivemos portanto a interação entre:
  • Júpiter-Saturno (ciclo de 20 anos)
  • Júpiter-Urano (cerca de 14 anos)
  • Saturno-Urano (cerca de 45 anos)
  • Júpiter-Plutão (cerca de 14 anos)
  • Saturno-Plutão (cerca de 35 anos)
  • Urano-Plutão (cerca de 130 anos)
Deste modo, a época emoldura o tempo presente pela importância do que aconteceu então, e ao mesmo tempo ilustra o que podemos esperar desse começo de século XXI, onde temos aspectos entre:
  • Júpiter-Saturno (em 2001 e em 2011)
  • Júpiter-Urano (em 2010-11)
  • Saturno-Urano (2008 a 2012)
  • Júpiter-Plutão (em 2008 e em 2011)
  • Saturno-Plutão (2008-11)
  • Urano-Plutão (2007- a 2020)
E Netuno, o planeta da integração, dissolução, transcendência?

O ciclo Urano-Netuno (170 anos) começou no final do século XX. Mas a conjunção entre Netuno e Plutão marca períodos definidos da história, pois acontece a cada 495 anos. Estamos no começo - em termos - de uma dessas eras de meio milênio: o século passado começou com essa conjunção, marcando a solidificação do capitalismo financeiro. A era anterior começara na Renascença, que foi também o início do capitalismo comercial, causa da vinda dos europeus para a América.

Uma moldura mais ampla ainda foi a conjunção, única desde que o ser humano registra a história, entre Urano, Netuno e Plutão, em torno de 580 a.C.. Richard Tarnas, cujas indicações estou seguindo neste tema, chama esse período de seminal, pois nele viveram os filósofos gregos pré-socráticos, Buda, Confúcio e, pouco antes, Zoroastro.